NOSSA ESPIRITUALIDADE BÍBLICO-LITÚRGICA
2º. DOMINGO DO TEMPO COMUM – 18.01.2009
“O QUE ESTAIS PROCURANDO?”
Toma, Senhor, nossa vida em ação, para mudá-la em fruto e missão. Toma, Senhor, nossa vida em ação, para mudá-la em missão.” José Acácio Santana – Cd Tua Palavra Permanece/O Chamado – Paulinas.
Para início de conversa
Não se sabe quem escreveu este Evangelho. O que se sabe é que ele é atribuído ao discípulo que Jesus amava, e nada mais. Desde o século II E.C., a tradição, reconhece que é o apóstolo João o autor do quarto evangelho. Pesquisas atuais porém, põem em dúvida esta afirmativa. A tendência atual é considerar o Discípulo Amado não como uma pessoa individual, mas coletiva, portanto, feito o Evangelho em mutirão: a comunidade joanina; o pano de fundo é o testemunho de João; e este testemunho não foi repassado de uma só vez, nem por uma só pessoa. É o resultado de um longo processo de releituras da comunidade na realidade em que estavam vivendo naquele instante, nas experiências novas que estavam sentindo na pele, no coração e na alma. Trata-se de um roteiro preparado com imenso carinho, o que nos impulsiona hoje, a rever a nossa própria vida em comunidade, no chão da vida de hoje. É o Evangelho em que Jesus vive em profunda e orante intimidade com o Pai e intensa solidariedade com o povo. Quem encontra Jesus, muda radicalmente, nunca mais a sua vida será a mesma.
João, ao contrário dos Evangelhos Sinóticos (Mt, Mc e Lc), não possui um ano próprio para ele, mas é partilhado nos três anos ABC, principalmente nos tempos litúrgicos do Advento/Natal e Quaresma/Páscoa/Pentecostes. Se observar direitinho, o Evangelho de João é lido quase por inteiro na nossa liturgia.
A data de composição e de conclusão, provavelmente, na última década do século I E.C., por volta do ano 95 E.C., e Éfeso, parece ter sido o local. O Evangelho de João entra no mundo simbólico do Primeiro Testamento: luz, água, óleo, trigo, vinho, casamento, trabalho, pastor, caminho, pomba, palavra e personagens, tais como – Abraão, Jacó-Israel, Moisés, a mulher infiel de Oséias, Davi e a esposa do Cântico dos Cânticos. Esta simbologia continua valendo; mas hoje, adaptamos a eles aspectos éticos e políticos como justiça, solidariedade, esperança, respeito pelo diferente, fraternura.
No Evangelho há o nome usado por YHWH ao se apresentar a Moisés: Eu Sou. Este nome será o nome próprio na boca de Jesus.
Ele explora o sentido especial de certos termos: sinal, conhecer, hora, ser do alto, acolher.
No Evangelho de João há coisas profundas ditas em palavras simples.
Contextualizando a vida com o Evangelho do Dia do Senhor – Jo 1, 35 - 42.
João Batista reconhece em Jesus, o Filho de Deus e o aponta para os discípulos: “Aí está o cordeiro de Deus”.
É esta frase de João Batista que abrirá os olhos e os corações daquelas duas pessoas, daqueles dois pescadores, e eles irão segui-lo. Uma frase apenas bastou para que eles entendessem que ali estava a Salvação. Eles tomam a iniciativa, sem esperar que Jesus os chame. O testemunho de João Batista bastou e ele entende que não está perdendo os discípulos, mas está os ajudando no discernimento. Agora, eles entram no caminho onde suas vidas serão mudadas e eles passam a ser testemunhas para muitos outros.
Observe que a frase de João Batista é de fundo pastoril e não de pesca. São dois mundos que se encontram, dois modos diferentes de trabalhar e de viver, são experiências muito diferentes que se encontram.
E neste encontro com Jesus ele faz uma pergunta crucial para as nossas vidas e que aparece em momentos especiais do Evangelho: “O que estais procurando?”
Nos momentos decisivos de nossas vidas estamos sempre repetindo esta pergunta central: “O que estou procurando?” “O que estamos procurando?”
Responder a esta pergunta não é fácil. Leva tempo e revisão de vida. E Jesus faz esta pergunta exigindo que se examinem a sério, que tomem consciência do que pretendem, e o declarem sem medo, sem vacilação, sem dissimulação. Pois, se desejam ser seus discípulos e o chamam de Mestre, deverão aceitar todos os riscos da caminhada. É o tema deste Evangelho de hoje: a vocação que se inicia a partir do testemunho do profeta.
Não é assim que começamos na caminhada em nossas comunidades hoje? Somos levados por alguém, alguém sempre aponta o caminho pelo qual experimentou, daí, optamos se queremos ou não.
No Evangelho de João, Jesus chama os seus discípulos de forma pessoal e direta, a partir deste chamado, começam a fazer uma experiência nova e a passam a anunciá-la.
Os discípulos querem criar laços de fraternura com Jesus, por isso perguntam: “Rabi, onde moras?”. Eles querem permanecer com o Mestre.
Eles seguem o Mestre até a casa dele. Entram, e podemos imaginar: conhecem o lar, a mãe, a carpintaria, os vizinhos; fazem a opção acertada e esta opção irá gerar bons frutos. Depois, quem narra o Evangelho vai dizer o nome de um dos discípulos: André, que significa homem; ser humano. André deixa de ser discípulo de João Batista para ser discípulo de Jesus por causa do que havia dito a respeito dele. Após a acolhida e as conversas, André vai ao encontro de Simão e o leva a Jesus. Simão não esteve entre os discípulos de João Batista, é uma conquista de seu irmão quando lhe diz: “Encontramos o Messias!”, e ao ser conhecido e reconhecido por Jesus, lhe impõe um novo nome e uma nova função na vida. Simão terá que aprender a ser Cefas (do aramaico kepa’ – rocha). Este nome só é encontrado no Evangelho de João; em outras passagens só se encontra o equivalente grego petros – Pedro. É este nome em grego que irá substituir o nome em aramaico quando os Evangelhos forem escritos pelas comunidades perseguidas pelo Império Romano e pelas autoridades judaicas.
Conhecer Jesus é reconhecer nos sinais a sua personalidade. Ele é apontado como o Cordeiro de Deus; André e o outro discípulo já o chamam de Mestre; Simão tem o seu nome mudado e começa a entender que se trata do Messias e que o encontro com ele é o encontro da mudança de atitude e da revisão de vida. Ao mudar o nome de Simão para Cefas/Petros, indica para todos nós o itinerário que precisamos fazer para conhecermos nossa personalidade.
Para o povo da Bíblia, o nome é a identidade da pessoa, é o que a define.
Qual é o significado dos nomes que possuímos? Por que nossos pais e mães escolheram estes nomes para nós? Qual era o contexto do momento em que viemos ao mundo? Este nome nos leva para onde? Para quem?
Perguntas que se somam a definição que temos de personalidade, como ela é construída no dia a dia, qual o papel fundamental dos amigos, da família e da Igreja na construção da personalidade?
Na vida em comunidade somos sempre conduzidos por alguém com mais experiência. Somos carregados no colo no batismo; depois, de mãos dadas participamos da catequese e entramos sozinhos na fila para receber a Primeira Eucaristia; por causa de um convite, participamos dos grupos de pré-jovens e de jovens,e algo queima o nosso peito, todo o nosso corpo e vamos de volta para a catequese para fortalecer o nosso batismo com o sacramento do crisma. E a partir daí, ou durante esta caminhada, cresce em nós a escuta do chamado que Jesus nos faz, e dentro deste chamado as exigências que ele nos faz. O que nos torna vocacionados.
E a vocação a qual fala o Evangelho de hoje é o seguimento a partir de uma frase, simples e profunda. E de respostas que nos fazem entrar no aconchego do Reino, mas que nos colocam em posição de seguir em frente.
A vocação em favor do Reino da Vida é fazer da vida uma missão. O melhor risco que podemos correr é fazer valer a vida; e que todos a tenham em abundância, e que reconheçam os sinais que surgem sempre antes do chamado definitivo do Mestre, chamado que não tem volta, e a recompensa é o bem-estar de todos, de todas as pessoas que acreditam que este mundo pode ser um mundo novo e possível.
Emerson Sbardelotti
Autor de O MISTÉRIO E O SOPRO – roteiros para acampamentos juvenis e reuniões de grupos de jovens. Brasília: CPP, 2005.
Autor de UTOPIA POÉTICA. São Leopoldo: CEBI, 2007.
Membro do Grupo de Assessores da Pastoral da Juventude da Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo.
Msn: emersonpjbes@hotmail.com
Blog: http://omisterioeautopia.blogspot.com/
Ilustração de Maximino Cerezo Marredo (http://servicioskoinonia.org/cerezo/)
Para início de conversa
Não se sabe quem escreveu este Evangelho. O que se sabe é que ele é atribuído ao discípulo que Jesus amava, e nada mais. Desde o século II E.C., a tradição, reconhece que é o apóstolo João o autor do quarto evangelho. Pesquisas atuais porém, põem em dúvida esta afirmativa. A tendência atual é considerar o Discípulo Amado não como uma pessoa individual, mas coletiva, portanto, feito o Evangelho em mutirão: a comunidade joanina; o pano de fundo é o testemunho de João; e este testemunho não foi repassado de uma só vez, nem por uma só pessoa. É o resultado de um longo processo de releituras da comunidade na realidade em que estavam vivendo naquele instante, nas experiências novas que estavam sentindo na pele, no coração e na alma. Trata-se de um roteiro preparado com imenso carinho, o que nos impulsiona hoje, a rever a nossa própria vida em comunidade, no chão da vida de hoje. É o Evangelho em que Jesus vive em profunda e orante intimidade com o Pai e intensa solidariedade com o povo. Quem encontra Jesus, muda radicalmente, nunca mais a sua vida será a mesma.
João, ao contrário dos Evangelhos Sinóticos (Mt, Mc e Lc), não possui um ano próprio para ele, mas é partilhado nos três anos ABC, principalmente nos tempos litúrgicos do Advento/Natal e Quaresma/Páscoa/Pentecostes. Se observar direitinho, o Evangelho de João é lido quase por inteiro na nossa liturgia.
A data de composição e de conclusão, provavelmente, na última década do século I E.C., por volta do ano 95 E.C., e Éfeso, parece ter sido o local. O Evangelho de João entra no mundo simbólico do Primeiro Testamento: luz, água, óleo, trigo, vinho, casamento, trabalho, pastor, caminho, pomba, palavra e personagens, tais como – Abraão, Jacó-Israel, Moisés, a mulher infiel de Oséias, Davi e a esposa do Cântico dos Cânticos. Esta simbologia continua valendo; mas hoje, adaptamos a eles aspectos éticos e políticos como justiça, solidariedade, esperança, respeito pelo diferente, fraternura.
No Evangelho há o nome usado por YHWH ao se apresentar a Moisés: Eu Sou. Este nome será o nome próprio na boca de Jesus.
Ele explora o sentido especial de certos termos: sinal, conhecer, hora, ser do alto, acolher.
No Evangelho de João há coisas profundas ditas em palavras simples.
Contextualizando a vida com o Evangelho do Dia do Senhor – Jo 1, 35 - 42.
João Batista reconhece em Jesus, o Filho de Deus e o aponta para os discípulos: “Aí está o cordeiro de Deus”.
É esta frase de João Batista que abrirá os olhos e os corações daquelas duas pessoas, daqueles dois pescadores, e eles irão segui-lo. Uma frase apenas bastou para que eles entendessem que ali estava a Salvação. Eles tomam a iniciativa, sem esperar que Jesus os chame. O testemunho de João Batista bastou e ele entende que não está perdendo os discípulos, mas está os ajudando no discernimento. Agora, eles entram no caminho onde suas vidas serão mudadas e eles passam a ser testemunhas para muitos outros.
Observe que a frase de João Batista é de fundo pastoril e não de pesca. São dois mundos que se encontram, dois modos diferentes de trabalhar e de viver, são experiências muito diferentes que se encontram.
E neste encontro com Jesus ele faz uma pergunta crucial para as nossas vidas e que aparece em momentos especiais do Evangelho: “O que estais procurando?”
Nos momentos decisivos de nossas vidas estamos sempre repetindo esta pergunta central: “O que estou procurando?” “O que estamos procurando?”
Responder a esta pergunta não é fácil. Leva tempo e revisão de vida. E Jesus faz esta pergunta exigindo que se examinem a sério, que tomem consciência do que pretendem, e o declarem sem medo, sem vacilação, sem dissimulação. Pois, se desejam ser seus discípulos e o chamam de Mestre, deverão aceitar todos os riscos da caminhada. É o tema deste Evangelho de hoje: a vocação que se inicia a partir do testemunho do profeta.
Não é assim que começamos na caminhada em nossas comunidades hoje? Somos levados por alguém, alguém sempre aponta o caminho pelo qual experimentou, daí, optamos se queremos ou não.
No Evangelho de João, Jesus chama os seus discípulos de forma pessoal e direta, a partir deste chamado, começam a fazer uma experiência nova e a passam a anunciá-la.
Os discípulos querem criar laços de fraternura com Jesus, por isso perguntam: “Rabi, onde moras?”. Eles querem permanecer com o Mestre.
Eles seguem o Mestre até a casa dele. Entram, e podemos imaginar: conhecem o lar, a mãe, a carpintaria, os vizinhos; fazem a opção acertada e esta opção irá gerar bons frutos. Depois, quem narra o Evangelho vai dizer o nome de um dos discípulos: André, que significa homem; ser humano. André deixa de ser discípulo de João Batista para ser discípulo de Jesus por causa do que havia dito a respeito dele. Após a acolhida e as conversas, André vai ao encontro de Simão e o leva a Jesus. Simão não esteve entre os discípulos de João Batista, é uma conquista de seu irmão quando lhe diz: “Encontramos o Messias!”, e ao ser conhecido e reconhecido por Jesus, lhe impõe um novo nome e uma nova função na vida. Simão terá que aprender a ser Cefas (do aramaico kepa’ – rocha). Este nome só é encontrado no Evangelho de João; em outras passagens só se encontra o equivalente grego petros – Pedro. É este nome em grego que irá substituir o nome em aramaico quando os Evangelhos forem escritos pelas comunidades perseguidas pelo Império Romano e pelas autoridades judaicas.
Conhecer Jesus é reconhecer nos sinais a sua personalidade. Ele é apontado como o Cordeiro de Deus; André e o outro discípulo já o chamam de Mestre; Simão tem o seu nome mudado e começa a entender que se trata do Messias e que o encontro com ele é o encontro da mudança de atitude e da revisão de vida. Ao mudar o nome de Simão para Cefas/Petros, indica para todos nós o itinerário que precisamos fazer para conhecermos nossa personalidade.
Para o povo da Bíblia, o nome é a identidade da pessoa, é o que a define.
Qual é o significado dos nomes que possuímos? Por que nossos pais e mães escolheram estes nomes para nós? Qual era o contexto do momento em que viemos ao mundo? Este nome nos leva para onde? Para quem?
Perguntas que se somam a definição que temos de personalidade, como ela é construída no dia a dia, qual o papel fundamental dos amigos, da família e da Igreja na construção da personalidade?
Na vida em comunidade somos sempre conduzidos por alguém com mais experiência. Somos carregados no colo no batismo; depois, de mãos dadas participamos da catequese e entramos sozinhos na fila para receber a Primeira Eucaristia; por causa de um convite, participamos dos grupos de pré-jovens e de jovens,e algo queima o nosso peito, todo o nosso corpo e vamos de volta para a catequese para fortalecer o nosso batismo com o sacramento do crisma. E a partir daí, ou durante esta caminhada, cresce em nós a escuta do chamado que Jesus nos faz, e dentro deste chamado as exigências que ele nos faz. O que nos torna vocacionados.
E a vocação a qual fala o Evangelho de hoje é o seguimento a partir de uma frase, simples e profunda. E de respostas que nos fazem entrar no aconchego do Reino, mas que nos colocam em posição de seguir em frente.
A vocação em favor do Reino da Vida é fazer da vida uma missão. O melhor risco que podemos correr é fazer valer a vida; e que todos a tenham em abundância, e que reconheçam os sinais que surgem sempre antes do chamado definitivo do Mestre, chamado que não tem volta, e a recompensa é o bem-estar de todos, de todas as pessoas que acreditam que este mundo pode ser um mundo novo e possível.
Emerson Sbardelotti
Autor de O MISTÉRIO E O SOPRO – roteiros para acampamentos juvenis e reuniões de grupos de jovens. Brasília: CPP, 2005.
Autor de UTOPIA POÉTICA. São Leopoldo: CEBI, 2007.
Membro do Grupo de Assessores da Pastoral da Juventude da Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo.
Msn: emersonpjbes@hotmail.com
Blog: http://omisterioeautopia.blogspot.com/
Ilustração de Maximino Cerezo Marredo (http://servicioskoinonia.org/cerezo/)
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